Tenho na família uma pessoa que como eu, também é portadora de lúpus. Agora no momento, está passando por uma fase delicada da doença: com derrame nos pulmões e no pericárdio. Diante do ocorrido, senti a necessidade de uma pesquisa sobre os envolvimento do lúpus com tais problemas.
Doenças Cardiopulmonares e o Lúpus
Elliot Chartash, M.D.
Professor Assistente de Medicina
North Shore University Hospital
Cornell University Medical College
O coração e os pulmões são freqüentemente afetados nos pacientes com lúpus sistêmico eritematoso (LSE). O grau do envolvimento cardiopulmonar varia desde a ausência de sintomas até complicações que requerem tratamento para o resto da vida. De fato, problemas no coração são a terceira causa mais comum de mortes de pessoas com LSE.
Problemas Cardíacos
O Lúpus pode atingir todas as partes do coração incluindo o pericárdio (saco externamente fibroso e internamente seroso, que reveste por fora o coração), miocárdio (a camada média, e mais espessa, da parede do coração, formada por músculo cardíaco), endocárdio (membrana que forra interiormente o coração) e artérias coronárias.
Pericardite (inflamação do pericárdio) é a doença mais comum que atinge o coração de pessoas com lúpus. Ela ocorre quando a membrana do pericárdio é atacada por auto-anticorpos e fica inflamada. Os sintomas mais comuns são pontadas no tórax abaixo do esterno, febre, batimento cardíaco acelerado e, ocasionalmente, falta de ar. A dor pode variar conforme a posição do corpo. Freqüentemente, a dor pode ser aliviada curvando o corpo levemente para a frente. A dor torácica pode ser comparada à dor de um ataque cardíaco. Em alguns casos de pericardite, os pacientes podem não apresentar sintoma algum. Exames sangüíneos, raios-X do tórax, EKG e ecocardiograma podem ser feitos para ajudar a diagnosticar a pericardite. O ecocardiograma é uma espécie de ultra-sonografia do coração que mostra ao médico se existe fluido em volta do coração. Nas pessoas com lúpus, não é raro encontrar uma quantidade excessiva de fluido ao redor do coração. Pelo fato da pericardite poder ser causada por outras condições além do lúpus, é necessário que a causa seja determinada com exatidão antes do início do tratamento. Se a pericardite é causada por infeção ou falha renal, o tratamento é diferente de quando ela é causada pelo lúpus. A pericardite lúpica pode ser tratada com agentes anti-inflamatórios. Se essa forma de terapia não tiver sucesso, um breve uso de corticóide é normalmente necessário.
Quando o lúpus causa inflamação do miocárdio a chamamos miocardite. Problemas sérios no músculo cardíaco não são comuns no LES. Os sintomas da miocardite incluem uma inexplicável aceleração nos batimentos cardíacos, um eletrocardiograma anormal, batimentos irregulares e parada cardíaca. A miocardite é freqüentemente associada com inflamações em outros músculos do corpo. O tratamento da miocardite lúpica normalmente inclui o uso de corticóides. Drogas imunossupressivas (Cytoxan, Imuran) podem ser adicionadas se a inflamação não for completamente controlada com esteróides.
Quando o lúpus causa inflamação do endocárdio (endocardite), as válvulas cardíacas podem ser prejudicadas, mas isso raramente afeta a capacidade de bombear sangue. A superfície das válvulas pode engrossar ou desenvolver protuberâncias como verrugas chamadas lesões de Libman-Sacks. Embora elas possam causar sopro no coração, é muito raro que essas protuberâncias afetem significativamente a função das válvulas. Se bactérias se alojarem nessas protuberâncias ocorre uma infecção (endocardite bacteriana). Isso também é raro, mas portencialmente muito sério e requer hospitalização. Raramente essa inflamação e danos das válvulas levam a uma deformidade que requeira algum tipo de transplante.
Finalmente, as artérias coronárias podem se tornar prematuramente estreitas nas pessoas com LES. Essas artérias conduzem sangue e oxigênio para o músculo cardíaco e são vitais para o bombeamento sangüíneo. O estreitamento ou bloqueio de uma artéria (doença de artéria coronariana) pode causar dores no tórax e ataque cardíaco. O estreitamento das artérias coronárias no lúpus pode ser causada por inflamação (arterite), pelo depósito de colesterol nas paredes arteriais (arteriosclerose), ou por coágulos sangüíneos. A arteriosclerose é a causa mais comuns de problemas coronários no lúpus. Pesquisas sugerem que pacientes com lúpus que tomam esteróides têm um risco maior de desenvolver arteriosclerose. A prevenção é o principal tratamento das doenças coronarianas. Controlar os fatores de risco cardíaco e a atividade lúpica, além de um cuidadoso monitoramento do uso de esteróides são necessários para prevenir ataques cardíacos em pessoas com lúpus.
Os danos cardíacos descritos podem se desenvolver da inflamação causada pelo lúpus ativo ou de medicamentos. O tratamento de problemas cardíacos deve ser específico para cada paciente e para cada problema apresentado. Um diagnóstico precoce e preciso combinado com uma terapia agressiva para reduzir potenciais danos ao órgão é a mais significativa consideração das doenças cardíacas causadas pelo lúpus.
Problemas Pulmonares
O lúpus pode afetar os pulmões de muitas formas. A pleurite (pleurisia) é a manifestação pulmonar mais comum do LES. A pleura é uma membrana que cobre a parte externa dos pulmões e o interior da cavidade torácica. Ela produz uma pequena quantidade de fluido para lubrificar o espaço entre os pulmões e a parede do tórax. Quando esta membrana é atacada por auto-anticorpos e fica inflamada, ocorre o que chamamos pleurite. Algumas vezes, uma excessiva quantidade de fluido pode ser acumulada no espaço pleural. Quando isso ocorre, chamamos de efusão pleural e ocorre com menos freqüência do que a pleurite. Se essa efusão é grande o bastante, ela pode ser visualizada em um raio-X do tórax. Uma vez que a efusão pleural pode ser causada por infecções ou outras condições que não o lúpus, o médico pode precisar de uma amostra do fluido para realizar alguns exames e determinar a causa exata do problema.
Os sintomas da pleurite incluem fortes e agudas pontadas que podem ser localizadas em uma área específica ou várias partes do tórax. A dor normalmente aumenta ao respirar fundo, tossir, espirrar ou gargalhar. Analgésicos, drogas antiinflamatórias não esteróides e/ou corticóides podem ser usados no tratamento da pleurite. A efusão pleural normalmente responde a esses medicamentos ou desaparece por si só com o tempo.
Pneumonite é a inflamação no interior do tecido pulmonar, que pode ser causada por uma infecção ou pelo lúpus. A infecção é a causa mais comum de pneumonite nos pacientes com lúpus. Bactérias, viroses, fungos ou protozoários são organismos que podem causar infecção nos pulmões. Algumas vezes a pneumonite pode ocorrer sem infecção sendo então chamada de pneumonite não infecciosa. Uma vez que as duas formas de pneumonite apresentam os mesmos sintomas -- febre, dor torácica, falta de ar e tosse -- considera-se que o paciente tenha uma infecção até que se prove o contrário. O diagnóstico da pneumonite requer exames sangüíneos, exames dos escarros e raios-X. Broncoscopia e/ou biópsia do pulmão também pode ser necessária para determinar se uma infecção é a causa da pneumonite.
O tratamento da pneumonite inicialmente inclui um curso de antibióticos. Se exames laboratorias e outros testes não mostrarem traços de infecção, então o diagnóstico confirmado é pneumonite lúpica. Essa pneumonite não-infecciosa é tratada com altas doses de corticóides. Drogas imunossupressoras como a azathioprina (Imuran) podem ser acrescentadas se a inflamação não for controlada com esteróides.
Doença difusa intersticial crônica dos pulmões é uma desordem relativamente incomum no LES. É uma forma crônica da pneumonite lúpica e afeta uma relativamente pequena quantidade de pessoas. Os sintomas incluem um início gradual de uma tosse crônica e seca; dores torácicas como na pleurite; e dificuldades para respirar durante atividades físicas. O diagnóstico requer a exclusão de infeção como possível causa. Além do lúpus, há outras causas da doença difusa intersticial crônica dos pulmões. Para determinar a causa exata, procedimentos especiais como a broncoscopia (inspeção visual do interior dos pulmões) e/ou uma biópsia dos pulmões são necessários. A correta identificação da causa é requerida para que o tratamento adequado seja escolhido com precisão. A pneumonite lúpica crônica deteriora os pulmões e diminui sua habilidade de entregar oxigênio ao sangue. O tecido pulmonar danificado age como uma barreira ao oxigênio que normalmente flui facilmente do pulmão para a corrente sangüínea.
A gravidade e a atividade dessa doença crônica pode ser medida e acompanhada com exames da função pulmonar (testes de respiração). A capacidade de difusão dos pulmões é uma medida de quão facilmente o oxigênio flui do pulmão para a corrente sangüínea, que é usualmente reduzida na pneumonite lúpica crônica. Medições periódicas da capacidade de difusão podem indicar a resposta ao tratamento e possibilita ao médico acompanhar o curso da doença. A pneumonite lúpica crônica é primeiramente tratada com corticóides e a resposta dos pacientes com freqüência varia. O curso da doença também varia; alguns pacientes podem melhorar vagarosamente, estabilizar, ou piorar com o tempo.
Ocasionalmente, pessoas com lúpus desenvolvem hipertensão pulmonar ou alta pressão sangüínea nos vasos dentro do pulmão. Se muito grave, ela pode ser vitalícia e com poucas chances de melhora. Ainda não existe medicamento eficaz para tratar a hipertensão pulmonar. Transplantes cardíacos e pulmonares podem ser uma opção para alguns pacientes nessas condições.
Conclusão
O envolvimento pulmonar não é raro no lúpus. A pleurisia e infecções são as condições mais comuns que envolvem os pulmões. A causa mais comunde pneumonite em pacientes com lúpus é a infecção. Pneumonite virótica ou bacteriana também são comuns e todas as pessoas com lúpus que têm um súbito acesso de tosse, febre ou dor torácica pleurítica devem notificar seu médico.
Geralmente, os problemas cariopulmonares associados ao lúpus respondem rapidamente ao tratamento, mas esse tratamento deve ser designado para cada paciente e cada caso específico. Novamente, um disgnóstico preciso e prematuro dos problemas e um tratamento agressivo para reduzir os danos potenciais ao órgão são cruciais para um controle bem sucedido das doenças cardiopulmonares do lúpus.
Fernanda Cavalcanti